Duas Coisas Muito Importantes

Na era da imagem. Sem imagens. Só palavras de duplo sentido. Que desenham qualquer coisa...

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Location: Lisboa, Olissipo, Portugal

Tuesday, July 29, 2008

Cheira ao que é bom…

…e o que é bom é Coura. Parades de Coura. O seu festival anual. Música e pouco mais do que isso. E é neste particular que reside toda a força deste evento. Tem música. Pouca música. Em doses variadas mas muito acutilantes.

E em Paredes de Coura também há rápel. Na correria com que se desce a colina para o bar. Também há o karaoke dos outros festivais. O facto acontece cada vez que uma banda sueca solta um refrão fresquinho como queijinhos de cabra. Todos berram e ninguém desafina. Não há microfone nem cabeleiras estapafúrdias em cima de malta acéfala. O cabelo (ou a falta dele) é da responsabilidade de cada um. Aliás, o rock`n`roll é sociologicamente isso mesmo, uma manifestação individual.

Em Coura também há fast-food. Depende da quantidade de pessoas que estão para atender na Tasca do Zé, melhor na “Benda” do Zé, ali mesmo antes da ponte. McRojões e Bifanas King. Há um pouco de tudo, sendo que a bebida varia um pouco mais do que os comuns engole-já. Em Coura há verde, tinto ou branco, e há amarelinha. Em barda e em doses exageradas como qualquer minhoto.

Os stands dos sponsors estão todos enfiados na peidoling dos outros festivais. Há locais específicos para um ou outro momento de marketing violador. Está minorizado e até é possível que o festivaleiro nem se aperceba de tal arrojo inestético.

Nos dias de festival também os transportes estão disponíveis até mais tarde. Ou pelo próprio pé, ou às cavalitas de alguém, ou mesmo empurrados por umaembriaguez crescente variando o tamanho consoante o horário. As moradias ficam mais perto do que nos festivais de cidade ou os outros. As tendas ficam ali mesmo à mão e os vales multiplicam-se consoante as vontades.

No festival de Paredes de Coura também existe muito e abastado engate. Seja em que formato for. Os predadores (os ou as) estão sempre disponíveis para atacar as presas. O destino é fácil. Todo e qualquer ser humano que esteja por detrás do balcão torna-se objecto de corte atarefado e caprichada. Quem paga quer um bom serviço e um engate torna-se tão caro quanto as cervejas pagas ao pessoal da cervejeira.

Em suma, estamos de volta a Paredes de Coura. Terra do amor. Este rapaz que vos destila letras volta lá em formato festivaleiro. Foi bom enquanto jornalista. Foi interessante noutras funções. De volta a casa….

COURA É AMOR

http://www.paredesdecoura.com/noticias/2006/noticia200619.htm



Monday, July 21, 2008

Nos dias em que não…

….Não. Nos dias em que não, não. É a frase que não sai. É o carro que não pega. É o livro que não termina. É o texto que não encarrila. É a banda que não pega. É a música que não se achincalha. É o disco que não é bem escolhido. É o eco que não é belo.

É a cabeleireira que não tem a culpa. É o vinho que não adstringe. É a voz que não se encaixa. É a palavra que não se escolhe. É a resposta que não se queria. É o menor que não se agiganta. É o restaurante que não serve. É a conta que nunca mais chega.

É a estrada que não acaba. É o sol que não se entusiasma. É a praia que não arde. É a hora que não é apropriada. É a vontade que não é culpada. É a culpa de não ter vontade. É o rabo que não se vê. É o caralho que não dorme.

É a bola que não levanta. É a cara que não mente. É o comprometido que não sabe. É a conversa que não sai. É o próximo que não entra. É porque não porque também. É o fim que não chega. É o início que não começa. É o não vos pedir desculpa. É a dor que não dói…

Tuesday, July 15, 2008

Shaaaaaaneeeaaaoooooo…

…é o berro que me acorda cada vez que vejo uma foto de Shane MacGowan. Esse mesmo, o vírus irlandês que um dia fundou uma banda de rock`n`roll a tocar umas coisas a atirar para a música irlandesa. Isso: The Pogues. Sendo que, primeiro, o mesmo grupo chamou-se PogueMahone, nomenculatura que foi alterada após os ingleses descobrirem que o nome queria dizer propriamente: Kiss My Arse, em irlandês…

«A Drink with Shane MacGowan» constitui o título do livro que termino. Trouxe de Cardiff. Estava a um bom preço (5 libras). Quem o escreve é uma jornalista que a determinada altura teve que comungar com a pouca higiene de Shane. Victoria Mary Clarke sabia que ele era alcoólico. Estava igualmente informada que o rapaz irlandês tinha aversão a água, fosse de que maneira fosse. Victoria era consciente que o meino gostava de encaixar uns punhos violentos em todo e qualquer antagonista que lhe ofenda a sua Guinness. A «bifa» também ouvia o que o atentado-homem cantava na sua banda. Sabia o que ele lia e o que pensava. Aquilo tudo contado e distribuído levou-os a um colchão térreo e da carne sexual nasceu um amor controverso.

O livro é sobre ele. Sobre eles às vezes. Mas é sobre ele. Um católico alcoolizado desde tenra idade. Entregue aos tios rudes e com falta de banho, que em Tipperary trataram de ensinar ao pequeno Shane de que era feita a Guinness. Mas também do que era feita a terra (a deles). De que era feito o penico que afugentava os guardas que procuravam debaixo da cama uns foragidos do IRA. O que era o rural e o profano. O que era herege e musical. Tudo num só momento. Os pais de Shane foram para Londres e só mais tarde é que este se juntou aos progenitores. Resultado? Clínica de reabilitação ainda nem maior de idade ele era…

O registo literário estende-se por múltiplas conversas. Da devoção previsível aos Dublinners. Do pouco chamamento dos Chieftains. Da visão sobre o momento punk, em que ele esteve na primeira linha. Dos rasgados elogios ao mundo fugaz dos Sex Pistols. Do seu apego ao reggae. Do quanto aprecia Nick Cave. De ser editor de uma zine de nome Bondage. Dos filmes que mais gostou. Dos poetas malditos irlandeses. Dos malfeitores da indústria do disco. Dos colegas de banda. Das trutas que aviava em todo e qualquer pub. De Angola (e desconhecimento político – surpresa!). Dos calabouços da polícia londrina. Das drogas (múltiplas). Da muita droga. Do álcool. Do never ending álcool.

Shane MacGowan é antagónico. Bêbado. Resmungão. Sem sentido. Profundo. Malcriado. Iluminado. Simples. Genial. Bruto como canecas de vidro. Sujo. Agressivo. Sábio. Culto sem ser intelectual. Artista. Rural. Medroso e valente. Um amor de pessoa.

Aqui o escriba pagou uma viagem do seu bolso para ir de Madrid a Londres. Só para os ver (eles, os The Pogues). Escrevi sobre o caso. Deram-me páginas centrais. E fui feliz…muito feliz…Por tudo isso…Just look them straight in the eyes and say…..POGUEMAHONE!!!!

Wednesday, July 09, 2008

Caerdydd…

…está para Londres como Torres Vedras está para Lisboa. E o conceito espalha-se à medida que as horas passam na capital do País de Gales. A dimensão da cidade. A pequenez da diferença. Os escassos recursos. A geografia encolhida. O estereotipo do povo. A coisa torna-se palpável a fim de um par de dias.

Caerdydd (Cardiff em galês) é a capital do Oeste. Os aviários também são negócio por aqueles lados. Assim como arquitectura também não prima pela eficiência estética. Ok, o passado victoriano ainda permanece por ali, mas a conclusão da modernidade está longe de se obter.

Eles, a rapaziada de Cardiff, bebem muito. Mas muito. É um Carnaval pegado em hora de ponta com direito a imagens dignas de semana académica às 04h00 da matina. A coisa não é fácil. Grupos de gente associam-se em máscaras e passeiam-se por pubs fedorentos (elogio!). O odor a álcool é sempre fresco em cada pub que se entra. Não há cá mofo. Ali bebe-se (já o tinha dito…). E bebe-se muito. E desde muito cedo.

Será um problema do râguebi? É preciso muita massa para marrar no adversário. Será da descendência celta que os obriga a tamanha selvajaria noctívaga?. Os resultados de tanto abuso são bem evidentes na mesma noite. Engates = 0. Não há libido. Não há toque. Não humano com humano. Humano com animal. Nada. O que quer que seja. Nada. Mas mesmo nada!!!

O povo arrasta-se até ao balcão. Atira uns pounds para cima da madeira e assopra o nome da bebida. As moças (loiríssimas e normalíssimas) reagem sem bola nenhuma. Nem enfadadas, nem entusiasmadas. A bebida vai para cima do balcão. É aconchegada pelo alcoólico seco e a pista de dança volta a ser invadida por mais uma garganta saciada. Mas para quê? Para dançar? Mas dançar o quê? Como? Rock? Celta? Techno? Funk? Funk off!!! O que eles querem é beber e dizer ao bêbado mais próximo que vai até ao balcão buscar outra bebida…

Como nos recônditos lugares do mundo, também em Caerdydd a alimentação é abusada. São descendentes de celtas, pois claro. E na substituição dos javalis entram os hamburgeres e colas. Logo, o tecido linfático é mais acentuado. Obesidade é a norma, principalmente no domínio feminino. Mulheres bonitas? As portuguesas emigradas…

Mas estes tipos, os galeses, comem bem. Quando o procuram. Ali, no Madame Fromage mesmo na “baixa” da cidade. Uma espécie de gourmet sem sofisticação tonta de cosmopolitismo de terceiro-mundo (vide as nossas lojinhas gourmet). No Madame Fromage a coisa pia fino. Slow food. E se queremos um Breton Fougasse, temos que ler atentamente o autocolante carimbado em cima da mesa, que reza assim:

«Our staff are really nice. If anyone is rude or unpleasant to them they will be asked to leave. We have recently had some impatient and rude customers who are under the illusion that we are a cofe or restaurant.(…)…our loyal band of regural customers know that we are a Delicatessen who now serve real hand made Slow Food…(…) If you want fast food, re-heated catering meals or need to rush to catch a bus YOU ARE IN THE WRONG PLACE». E meus caros, quem sou eu para acrescentar uma virgula que seja?

Friday, July 04, 2008

Como legitimar o erro . . .

… tem sido uma das experiências particulares de quem vos escreve. As formas sociais da “desculpa” ou “inevitabilidade” estão socialmente aprovadas, pese embora, haja quem se importune por, e tomando como exemplo, a classe política não pagar pelos seus erros. Acaba o mandato e outros pagarão por erros calculáveis. Basta espreitar relatórios, orçamentos e celebrar o porreirismo da coisa. Aquele patati-patatá de quem faz a revolução sentado…

Na música, particular do agrado deste mecânico das palavras, a coisa dá-se da mais variada forma. Longe vão os tempos de insuficiência vocal. Dos grandes cantores. Dos artistas de big band. Os nossos Tony de Matos. Os Calvários e Sinatras da vida. As grandes vozes. Agora, mais de 50 anos depois desse boom de voz-de-macho-e-cabeça-de-mulher, o que se pede é gente afinada. Pelo menos ao vivo…Agora se a voz cantada da rua se ouve no oitavo andar, isso é….balelas….marimbando…

A multiplicação de géneros e sub-categorias musicais encontrou outros espaços confortáveis para as “não-vozes”. Tomando como exemplo o hip-hop. A rítmica é a sua musicalidade. Não há que enganar. Dificilmente está fora de tom e caso esteja fora de ritmo, assunto arrumado, sempre pode mexer com a mesa de som, aprumar o seu lado b-boy ou arriscar com uma lata de spray…Dedique-se a outra arte que não a do “máique”…

O grosso do hip-hop legitimou o erro quando se tornou mainstream. Não que o hip-hop seja um erro. De todo. Ninguém, todavia, teve mais que ter uma voz de rouxinol, muito menos de galã latino à procura do travesti mais próximo, para poder singrar no mundo da canção. Ninguém canta. Aqui, ou bailam todos ou não baila ninguém. Todos aspiram ao palco, seja em que moldes for. Basta ritmo e uma língua treinada. “Não cante e encante”, podia ser o slogan.

Portugal, no seu nichozinho, no seu atrasozinho, no seu semi-cosmopolitismozinho, também já dá espaço ao erro. Vide o caso de rappers com deficiência na fala. Com espinhas de massa mais ou menos evidentes. Com pronuncias de várias regiões que tanto se reinventam em Gaia como em Olhão. Tanto vale um “b” por um “v”, como “unxolhos” por “uns olhos”. Tanto vale ter “um amor adim” como “um amor assim”. Vale tudo. E não me parece que vá mudar (será necessário? Ou partimos para as antigas aulas de voz?).

A expectativa dirige-se para ver se alguém pegará na coisa. De forma crítica. Ácida. Ressabiadíssima. Assim cheio de certezas. Quem se lembrará de corrigir a rua? De repreender o instinto. De censurar as idiossincrasias. De corrigir o erro, sendo que é no erro que se encontra a diferença. E nos “entretantos” lá nos divertimos a descobrir as imperfeições vocais de Cidinho e Doca, na banda-sonora da «Tropa de Elite» (a falta de dentes à frente tem destas coisas…). Ou mesmo quando Jorge Ben Jor cantava “eu olho prá voxê…pois voxê prá mim não olha”…Haveria algum mal?...Na rua erra-se….mas não é na rua que está o poder?...”Não se passa nada”….