Duas Coisas Muito Importantes

Na era da imagem. Sem imagens. Só palavras de duplo sentido. Que desenham qualquer coisa...

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Location: Lisboa, Olissipo, Portugal

Thursday, March 29, 2007

«Relativamente importante»…

…parece ser a tónica apontada por pensadores, sociólogos e contextualizadores da nossa praça acerca do resultado do concurso organizado pela RTP tendo em vista a eleição da série «Os Grandes Portugueses».

Quem votou? Com que intenções? Reagindo a que tipo de estímulos? Muitos relativizaram indicando que, o resultado daquele espaço de entertenimento da televisão público, não tinha a menor fiabilidade possível. Outros indicam que terá sido a «morte simbólica do 25 de Abril». Estes, compreenda-se, um tanto ou quanto mais dramáticos. Do editorial do Público (pertinnente, meu caro José Manuel Fernandes), ao catedrático que nada diz (Adelino Gomes), ou até mesmo a Eduardo Lourenço, que indicou que o resultado é um «um scanner do estado cultural de uma nação sem memória». O choque tecnológico, portanto. As reacções são várias e algumas delas menos interessantes. Esta presente também não tem a pretensão de chegar onde quer que seja.

Factos a considerar: a mobilização da extrema-direita nacional. Facto que parece que também já se cheira ali pelos lados da Alameda da Faculdade de Lisboa. São putos fresquinhos. Sabem usar telemóveis. Isso é certo. E mais. Estão perturbados por não terem pelo que lutar e lembraram-se de embirrar com o estupor do preto do CSI que rouba a atenção da irmã mais nova. Estão furibundos e querem que o Sócrates destitua Elton John como o ícone gay. Vamos tatuar 1143 nos gémeos e trabalhar para a Casablanca Productions enquanto levamos com cuspidelas do 50 Cent na tola…Duros…durinhos, vá….

Facto: o Partido Comunista não tem ido à cabine telefónica. A memória está tão velha como a faixa etária que sustenta o partido – velha, portanto. As ganzas têm ocupado as mãos e o custo da chamada chega a ser mais cara do que um charro. Os novatos, provavelmente, ainda não conseguem decorar o Manifesto do Partido porque este ainda não se encontra disponível num jogo da PS3.

Facto: A RTP não tem um provedor de qualidade. Se é certo que os programas que recorrem à memória de um povo têm sido apontados como um trunfo certo em qualquer programação televisiva, a verdade é que o resultado deste programa cheira a estrume. A mofo. A um País não resolvido. Sem perspectiva de avanço. Sem vontade de querer mais. Queremos o de sempre, isso basta e reconforta. Cheira a Salazar, claro está.

Facto: A RDP é perseguida e a Maria Elisa continua a monte. A estratégia de deixar Salazar de fora da primeira votação revelou-se útil resultando em polémica. Perfeito, estamos perto das perfomances da TVI! Quem votou, provavelmente, foi enquanto fazia zapping durante o intervalo do concurso da TVI. Maria Elisa, a mestra. Salazar, o belo.

Facto: estamos perante uma geração que pouco se revê na esquerda tradicional. E mesmo na moderna. Que não se revê na esquerda, ponto. O 25 de Abril é bom para ir à praia ver os primeiros nacos bronzeados do ano. A esquerda é utópica e a utopia é a direita. Temos todos que deixarmo-nos de romantismos e apertar o cinto. Os resultados sobrepõem-se aos meios. Nada mais natural. E o que importa é gritar «Por Portugal», seja lá o que isso for…

Facto: Quem é Salazar? Quem é Cunhal? Para quê «o» Pessoa? Vasco da Gama é no Parque das Nações. Marquês de Pombal é para onde vamos se os lampiões limparem os tripeiros! O Camões é um nigga muita chato que rima mas não tem flow. Afonso Henriques é um bom estádio mas o Vitória tá na Liga de Honra. Aristides de Sousa Mendes?....pois…

Facto: gastei imenso tempo a tentar não dizer nada acerca do programa. Não me revoltou o resultado. Mas ele aconteceu e não convém ignorar. Podia ter gasto toda esta força e a leitura do meu excelso leitor para falar do serviço público que o romântico prestou no programa sobre o Portugal de hoje. Não fora os lugares-comuns de mostrar pretos quando se fala em imigrantes, de uma linguagem entre a erecção e o desalento pós-orgástico, de não ter mencionado que há uma televisão pública que faz programas tipo «Os Grandes Portugueses», e teria sido um óptimo momento de televisão. Assim, foi só quase real

Thursday, March 15, 2007

O triunfo do pântano…

finalmente. Já era hora de assumir que este nosso Portugal privilegia o pântano em detrimento de tudo o que mexa. Têm existido algumas tentativas insuficientes do ponto de vista do aniquilamento de todo e qualquer pensamento que perturbe a ordem pantanosa do desenvolvimento intelectual deste tão querido País. Optamos sempre por «as coisas como são». «Dantes é que era». «Foi sempre assim». Porque não dar continuidade a esta característica mas de uma forma cabal e para que não constem dúvidas?!?!

Caso pragmático. Atente-se no resultado veiculado pelo provedor do ouvinte das rádios estatais, José Nuno Martins. O relatório anual foi divulgado e a confusão instalou-se. O esmerado comunicador, agora polícia maior do hertz estatal, indicou que uma das estações de rádio do Estado (Antena 3) poderia incorrer no risco de perder o financiamento. Causa? «Excessiva modernidade da música da playlist da emissora», entre outras. Agora…já depois dos fígados trucidados, do petardo rebentado no estômago, do esfacelamento encefálico de tão aberrante resultado, recuperamos e tentamos pensar (sim, que isso doi).

Que Portugal é este? Que ouvintes serão esses que se queixam? Que legitimidade terá o provedor do ouvinte? Que mal tem a modernidade?!?! Mas que merda é esta??!?!

A Antena 3 é a rádio que mais trabalhou a qualidade nacional. Sem dúvida. E não o fez com aquela perspectiva irritante de encarar os músicos e artistas portugueses como seres menores. Mas optando antes por encaixar a crescente qualidade nacional com produtos internacionais. Os mais reaccionários estão na linha da frente no queixume. «Não há nada de novo». «No tempo do Rock Rendez Vous é que era». E tantos outros bla bla blas, típicos de quem não arrisca desviar-se da rota casa-trabalho-casa. Mudam-se os tempos, deviam mudar-se os postos…

A Antena 3 deu espaço ao erro. Não teve medo da evolução. Tem sido altifalante de uma nova portugalidade. Da diáspora em acção. Dos Fadomorse aos Buraka Som Sistema. Da Kumpanhia Algazarra aos Bunnyranch. Dos Linda Martini aos Blind Zero . Todos. Todos foram crescendo com a rádio. Muito graças à «Quinta dos Portugueses», que tantas críticas recebeu mas que os proveitos estão à mostra. (Um bem haja, caro Luís Montez!). A iniciativa possibilitou uma maior difusão do trabalho mas também com uma obrigatoriedade de apresentar um produto final que correspondesse a um padrão de qualidade mais do que a de «razoável».

Gosto quando a Antena 3 não divulga maquetas. Não o faz, simplesmente. Obriga a um esforço suplementar de quem julga que mandar umas castanhadas em guitarras já pode ser o melhor da sua freguesia.

Os padrões elevaram-se. A Antena 3, paulatinamente, foi conquistando ouvintes exigentes. Que necessitam de novidades diariamente. Que não se importam de estar a ouvir uma rádio e esperarem pelo final de uma determinada música para saber que artista novo se trata.

O meu caro José Nuno Martins, com todo o respeito, não pode embarcar numa onda resultadista. As rádios estatais servem para serviço público e não para fins comerciais. Para repetir os Bryan Adams da vida já existem milhentas cópias. Quero uma Antena 1 em força com Amélia Muge, com Fausto, com Brigada Victor Jara, com Vitorino. Quero uma Antena 3 com Hiena, Dead Combo, Cartel 70, Oioai, Cool Hipnoise, Xutos & Pontapés. E quero porque pago os meus impostos e também mereço ser ouvido, caro provedor…

Wednesday, March 07, 2007

A ciência das coisas…

…não perdoa. Dizem-me ao balcão de um bar mal frequentado no coração de um Bairro que já esteve em alta. A provocação é tal que deixamo-nos ficar a observar engates baratos enquanto se batem palmas à quase despassarada passagem de um tema muito conhecido dos Smashing Pumpinks. «Este é que é um ganda som», exulta o técnico de chiclas porta-à-porta. É a «ciências das coisas», eu compreendo. A «ciência» de se poder dizer um monte de nadas, sem fazer descontos para a Caixa ou acrescentar despesas no IRS. Mas que coisas? Nadas, pronto. É a ciência de todos os nadas que tanto explica sobre este mundo. E pensamos muito pouco a propósito, «uma festa dos 90 é que era». Guarda-se a ideia e avança-se para a desprezível sedução que quatro shots podem provocar num encontro de olhares, nunca gémeos, de alguém que nos está presente por perto.

Avança-se para uma noite profunda. De cores garridas e ideias libertinas. Gritam-se «vivas» a coisas como Cristina Aguilera ou outra diva qualquer tipo Boy George, enquanto se gala o quadril adulterado de um Artur, que agora responde por Sónia. Geme-se por não se ter mais senhas-do-bar e o calor de Inverno a pedir descompressão social. É a «ciência das coisas» que nos obriga a não pensar e avançar para os últimos euros perdidos na verilha cansada.

Acorda-se estremunhado e segue-se para uma viagem de 400kms ao volante. A porta não está bem fechada e este fim-de-semana ainda se prepara para ventos inesperados. Entre Gaiteiros de Lisboa e Astrud Gilberto o percurso torna-se menos penoso. Dead Combo é mesmo a melhor companhia de viagem, confirmo. É a «ciência das coisas» a explicar que «uma canção, uma banda, um acorde pode ter um valor sacramental em determinado momento». A «ciência das coisas» finaliza indicando um taxativo «ou não».

Estamos em Ponte de Lima quando a «ciência das coisas» volta a atacar no menosprezo sanguíneo de um ente (infelizmente) próximo. Mais adiante, esquecemos o degredo do inevitável grupo sanguíneo e explica-se um pouco da «ciência das coisas» quando alguém nos dá um bombom. Um abraço em overdose, portanto.Um pequeno «nada». Um pouco de «ciência das coisas». Válido.

Arranha-se a garganta quando se desce no elevador que fede a enfermeiras. Elas sorriem para aliviar o transtorno. Evita-se o quarto por ter a certeza que o último registo pode danificar a dignidade da memória. Faz-se contas entre a porta a aproximar-se e um «Périnho» dito de forma atabalhoada com toda a sapiência que o amor sabe soletrar. É a «ciência das coisas» a tentar ponderar, entre um nada e o vazio. Tanto filho-da-puta pronto para ser empalado por um touro raivoso e logo aquele pedaço de ternura é que haveria de estar a tremer das pernas e a pedir para ir ao «quarto de banho». Aguenta, António. Eu...