Duas Coisas Muito Importantes

Na era da imagem. Sem imagens. Só palavras de duplo sentido. Que desenham qualquer coisa...

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Location: Lisboa, Olissipo, Portugal

Tuesday, January 23, 2007

Delay cinemático…

...assumido. Sofro de uma terrível doença cultural. Tenho «delay cinemático». Não está na cútis. Não doi. Não está relacionado com ossos. E por muito que tentem destruir o meu sistema hepático, também não ataca naquela zona corporal. Padeço desse síndroma e não tenho como cura-lo.

Sintomas? Pouca vontade de me enclausurar dentro de uma sala de cinema por mais de duas horas com umas 40 almas desconhecidas. Contorno «programinhas» de idas ao cinema, ora com a casualidade de um trabalho qualquer (verdadinha), ora por ineficácia das minhas vontades.

Venero a arte da imagem mas não persigo como faço com música, por exemplo. Sou indivíduo para assistir (e participar, tenuamente) num debate sobre cinema. Creio que a sétima arte encerra em si tanta semiótica e sociologia (entre outras ciências) que é inevitável para um curioso não se deixar encantar.

Ora, ao padecer de tão grave síndroma perco muita da actualidade cinemática deste mundo. Ou vejo (poucos) antes de todos os outros (relembro os mais recentes «Coisa Ruim», «Diários de Che Guevara» ou «Hotel Ruanda») devido a um passado recente na área do jornalismo cultural, ou então perco-me durante anos (sim, a coisa é grave).

Foi ao visionar «O Segredo de Brokeback Mountain» que reconheci, para mim, o síndroma de que padeço. O filme já tem mais de um ano e só agora, através da edição em DVD, tive contacto com a obra. Magnífica, saliente-se. Ou melhor, soberba. Um «quase» clássico. E salvaguardo «quase» porque existem algumas falhas em certos planos. Pequenices importantes na hora de eternizar obras. Existem, por exemplo, demasiado ruído visual em planos «sociais», ou seja, quando os protagonistas não se encontram nas pradarias, mas sim em bares, por exemplo. No cinema «clássico» essa limpeza é indispensável. Há esse equilíbrio imagético. Pictórico.

Mas no computo geral, e é através dessa equação final que as contas são feitas, existe nesta película matéria suficiente para o tornar «um dos mais belos filmes de sempre», parafraseando José Miguel Gaspar, do Jornal de Notícias. Existe uma história de amor incrível. Ponto. Não existe homossexualidade coitadinha. Não existe glamour exacerbado. Não existe o exagero pacóvio de umas drags só funcionais em palco. É amor e diz que doi.

E tem um argumento seguro. Ciente do que quer. Consciente de que uma história de amor quanto mais dolorosa, mais eterna e única se torna. Existe o cuidado de não acabar bem. A autora, Annie Proulx, venceum um Prémio Pulitzer e escreveu o original desta história. E o filme merece, de sobremaneira, o Óscar para Melhor Banda Sonora Original. Gustavo Santaolalla, pois claro. Esse gigante compositor!

Perdoe-me o «delay cinemático»…vou tentar não voltar muito ao «passado»…só se o caso se justificar…

Monday, January 15, 2007

A Adega e a Lily das meias altas…

É tão bom estar enamorado. Imiscuindo-me de citar José Eduardo Moniz numa das suas últimas entrevistas quando se referenciava ao seu (de)mais-que-tudo, confesso que corroboro com o homem. É difícil estarmos muito tempo sem nos envolvermos com uma…cena.

Ora, a esta humilde criatura bateu outro enamoro. É. Tirei férias do Brasil e mudo-me de letras e elogios para o meu querido Reino Unido. É de lá que me chegam notícias boas sobre duas personagens, que calam fundo na minha retórica elogiosa. Uma delas já não será novidade, apenas um reforçar de posições. Lily Allen. Já tinha deixado alguns indícios de sedução sobre esta menina.

O reforço deste namoro foi-me dado por uma entrevista dada pela menina à Uncut. Lá ela confessa que vendia droga em Ibiza aos 15 anos. Aliás, a menina revelou interessantes teorias sobre as mesmas. «Cocaine? You`d just stand around talking bollocks all night. Ecstasy? You`d think your music was the best ever and it`d sound like shit (...) Golden rule with drug-dealing: don`t get too enthusiastic about your own merchandise».

Esta é a menina que estiliza o seu homem entre Graham Coxon (o anhuca dos Blur) e Peter Crouch (esse mesmo, a girafa da selecção inglesa). Lily Allen gostaria de ter uma cena a dois com a Paris Hilton e apetecia-lhe esmagar o crânio das Sugababes. Não se considera louca. Planeia filmar uma orgia com o resto da banda, para fins comerciais. Crê que reencarna o Ghandi, mas que no entanto ainda se acha bastante longe da representação terrestre do xamã Joe StrummerJoe was the most amazing man who ever walked the Earth»). Menina, respect!

Este foi um flirt comparado com o fogo soul que me rapa desde os tornozelos até ao baixo ventre…Nome? Amy Winehouse. Álbum? «Back to Black». E tremo. Uma autêntica teia dos afectos. A força de um punhado de músicas espalhadas por um álbum que aguenta-se. Chega ao fim. Consegue esse feito sem nos maçar. A Motown pejada glamour intemporal. A filha branca que Aretha Franklin quis esconder devido ao embaraçante, e ao mesmo tempo festejado, alcoolismo da menina Amy. Cassandra Wilson e Etta James a brincarem com DJs branquelos da noctívaga Londres. Tudo na Amy Winehouse (adega, portanto…).

E após degustar freneticamente o disco, fui atrás da imagem. Soberba! Morena de olhos azeitona. Cabelo esgadelhado a sair da cama após consumir sexualmente mais dois kilogramas ao companheiro. Brincos de argola largos em jeito de pegas. Lábios de riso demoníaco e sensual. Tatoos naifs. Imagem menina-que-podia-tatuar-umas-cerejas-mas-quero-é-vinho.

«Pure Soul Power», intitula a Mojo acerca de um espectáculo da moçoila. E a publicação vai mais longe. «Clutching the microphone as if her life depended on it, she`s a fun-house hall of mirrors-contorted vision; a gorgeous cross between a 50s pulp novel jacket Bad Girl and the Walt Jabsco gangster, her hair half-a-foot high, Kohl black, teased and tangled, with a yellow rosebud poking out above her right ear (…) with eyes shining bright out of heavy Cleopatra make-up, her mouth daubed in red lipstick quickly smudged from gulping at a glass of red wine». Bla bla bla. É tesão pura e mainada.

«Arruada»

Nem sei para que me trago comigo

Não tive tempo para me ouvir, desculpa-me

Insistes em mim e não tenho a certeza que insisto por mim

Não calhou em conversa e por isso não me dirigi a mim

Tentei falar comigo ou para mim?

É a minha vez de falar?

Por mim nem falo de mim mas eu falei-me?

Se passar aqui alguém ainda acabo a falar para mim…

Se é para isso que me chamei nem quero conversas comigo

Tanto tempo à espera e afinal era comigo que queria falar

Eu só falo comigo

Música: «Arruada»

Edição: via myspace.com/laiamusic no 2º semestre de 2007

Wednesday, January 10, 2007

CD`s não…

«CD`s não». Esta foi a resposta sucinta, e muito marcante, que o sujeito A deu ao sujeito B, por sinal, um grande parceiro meu. O mesmo sujeito B apenas tinha aconselhado a namorada do irredutível sujeito A uma hipotética prenda de aniversário, ou seja, um CD. O episódio foi-me relatado pelo meu camarada (sim, o B). E aquilo latejou-me alarvemente neste bidon de ideias perdidas em que acumulo funções cerebrais.

É um assunto caro a melómanos. O iminente desaparecimento do disco. Os padrões tendem a alterar-se. O próprio sujeito B (sim, o meu camarada) confidenciou-me que o mesmo indivíduo que rejeitara a oferenda é ele próprio um semi-melómano. Mas de outros tempos. Destes tempos controversos em que se assiste a um massificante desapego do objecto, quando, ao invés, se proclama sociedade materialista. Confuso, não? Então quando o indivíduo mais bem posicionado no seu ágora social é aquele que apresenta um rol maior de objectos/produtos/etc., onde é que se faz lógica quando a posse de CD deixa de ser obrigatória?

Livrando-me de qualquer perspectiva de apologista do consumo, apenas tento conjecturar neste reduzido espaço encefálico, quais as lógicas neste paradigma. Sociedade materialista rejeita objectos (CD`s). Ok…

E prossigo. Será que a música deixará de figurar, em breve, no espectro artístico? Ou seja. Qualquer obra artística, das artes plásticas ao teatro, do cinema à pintura, a obra de arte quer-se contemplada. Observável. Palpável. Quase que tridimensional. Algo que nos obrigue ao movimento perante a mesma obra, ou nos derreta imóveis. O que seria dos quadros caso se reduzissem a um ficheiro com nome e extensão apenas reproduzível em máquinas? O teatro seria exequível caso não existisse em palco mas sim num documento de 873 kb? E a música? Será que a música vai estar reduzida ao referido ficheiro, sem qualquer apego visual? Sem sugestão? Apenas mais um ficheiro entre milhares? Não será possível albergar outras disciplinas artísticas (gráficas ou multimédia) que era possível apreciar num CD, vinil ou K7? Nada? Só um ficheiro? uma música de uma banda da Tailândia? Sem um obrigado ao primo deles nos acknoledgments do disco? Sem ficarmos a conhecer o trabalho visual de um tipo chileno, que mesmo com fracos recursos, conseguia um resultado surpreendente nas capas de discos de bandas australianas?

Quer dizer, já ficamos desvirtuados de ficar a olhar para o rodar do vinil desde que os CD vieram esgalhar as rotações dos discos. Alguns ainda continuam a olhar para o visor do leitor de CDs, mas isso são outros vícios…O que nos resta então?

Ok, “a música é para ser ouvida” dirão os mais despachados, só naquela da urgência pela novidade revelando a descontinuidade intelectual e deficiência na percepção de mais do que livros da escola e “chica espertice” de bairro. Não sei. Mas não sei mesmo.

Aguardo pelo dia em que, um grande artista decide editar um só tema. Passados dois/três meses edita outro. E depois logo vê se lhe apetece mais. Tudo via online. E aí voltamos aos idos dias do single. Das bandas/artistas do one hit single. Aqueles artistas fugazes que nunca mais ouvimos falar. Os Gnars Barkley já eram uma aproximação à coisa. Mas lá se decidiram pelo álbum...Estamos reduzidos ao vácuo de conjugação de binários? Não posso ter mais obras de arte na minha mão?...